quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010



















Eu antes de ser já era,
eu já fui quem não sou.



Floresci muito antes que a primavera das flores,

muito antes que a literatura dos povos escrevi,

precedendo aos poemas, à poesia,
a essa indecifrável e inexistente intempérie da alma.



A luz que trago em meus olhos não nasceu neles,

era uma sombra que latejava em tudo o que sabiam que iam ver,
em tudo aquilo que sabia que ia ser visto,
em tudo o que meus olhos ignoravam.



As palavras choradas pelas estátuas dos cemitérios,

suas lágrimas de pedra,

foram ditas por mim antes de nascer a morte.



Nos rios, as árvores e os pássaros,
na água, a terra e o ar,

nos elementos da vida vivo desde muito antes que a vida.



Tudo aquilo que parece intocável,

in substantivo, intangível, etéreo,

tudo o que se acha que não é nem pôde haver sido,

já o era eu antes de ser.



E com tudo,

apesar disso ou talvez por isso,

ainda não chego a ser sendo,

ainda minha voz não se formou,
ainda busco entre as trevas da memória,

da [des-memoria],
do tempo, de seus ritmos e arritmias.



Sim,

procuro,
busco a maneira de ser como era antes,

ser como são as coisas,

como é este agora

e viver em mim para ser o antes do ser de sempre.



Peço ajuda para profanar os templos,

para entrar nos segredos e violá-los,

para divulgar a heresia,

para, definitivamente,

encontrar o caminho, a verdade e a vida.









2 comentários:

in_side disse...

é simples é apenas ler
dizer derreter

crer e mover

pelo avesso e ao contrário dos lugares onde antes

nos amarraram e sentaram em bancos e camas fofas de almofadas
[ e a batatas fritas e peixe grelhado

nos fecharam e alimentaram e hereticamente pediram-nos para entregar tudo o que era amar e sabiamos de sempre de amar - que já lá vinha escrito e inscrito e comentado,

[ e não era nada já amar depois

e então ali trocámos tudo o que já sabíamos por nada e assim ficámos irremediavelmente a morrer até ao dia em que acordámos entre a vida e a morte -
- vague antes tubu lares
entre tumbas de circo

nascendo de restos de brincar aos mortos -enferrujados

pequenos fios de memória da verdade no templo mais interior do verbo

no bolso uma mão com dedos um gesto a puxar

medos e medos matéria escura compacta de medo e no entanto nascendo do
sem pre do
sem-pre as-sim poalhados de luz

molhados
do longuíssimo frio gelado

a van çar,

e sorr ir e segur ar e

a van çar e res pirar e

a van ç ar e

do mais profundo ar

do mais antigo fé a pé - pé a fé
os novos passos nus e vazios

[ vazio e virgem da língua à alma e ao in vés

palmo a palmo

re começ ar






~

~pi disse...

belo pequeno doc...


[ beber uvas

falar pedras

con fiar





~